Profissional da saúde não pode acumular cargos se jornada excede o comum
A 4ª Câmara de Direito
Público do TJ reformou decisão da 2ª Vara de Guaramirim, em ação que J. N. F.
S. moveu contra o município. A técnica em enfermagem acumulava dois cargos, um
na Secretaria de Saúde de Guaramirim e outro no Hospital Municipal Santo Antônio.
Apesar da compatibilidade de horários, os desembargadores entenderam que havia
excesso na jornada de trabalho.
A servidora exercia suas
funções na secretaria de segunda a sexta-feira, das 7h30min às 12h e das 13h às
16h30min, executando jornada semanal de trabalho de 40 horas; no Hospital
Municipal Santo Antônio, trabalhava das 19h às 7h, em regime de 12 horas de
trabalho e 36 horas de descanso, computando 31 horas e 15 minutos de trabalho
numa semana e 41 horas na outra. Ou seja, em uma semana a jornada era de 71
horas e 15 minutos; na outra, ultrapassava 80 horas.
Os argumentos de J. são
de que a Constituição Federal garante aos profissionais da saúde a acumulação
de dois cargos e de que não havia conflito entre os horários. Embora a autora
tenha conseguido a manutenção dos dois empregos no juízo de 1º grau, os
desembargadores decidiram-se pela incompatibilidade.
O relator da matéria,
desembargador Jaime Ramos, utilizou uma decisão da ministra Carmem Lúcia, do
Supremo Tribunal Federal, para justificar que a compatibilidade de horários não
deve ser entendida apenas como ausência de choque de jornadas. Segundo Ramos,
não é razoável que um profissional com excesso de trabalho consiga desempenhar
todos os procedimentos de suas funções com a mesma atenção, o que violaria o
princípio da eficiência do serviço público.
“A atividade de técnico
em enfermagem é extenuante, exige atenção redobrada, pois dela dependem ações
efetivas de cuidados a pacientes internados, atendimento ao público, aplicação
de vacinas, administração de medicamentos, etc. Um mero descuido em tais
procedimentos pode ter consequências negativamente importantes para o paciente,
de modo que a dupla jornada somente contribui para o incremento deste risco”,
afirmou o desembargador. A decisão foi unânime.
Processo: Apelação Cível
n. 2011.078396-4
Fonte: Tribunal de
Justiça de Santa Catarina, divulgado no site da AASP em 20/01/2012.
** Comentários do Advogado
Eduardo Figueredo de Oliveira
Trata-se de questão que
aflige a todos os servidores que, conforme a CF/88 podem acumular de cargos,
empregos e funções no serviço público.
O assunto tem sido mais recorrente
no âmbito do serviço público federal. Contudo, vemos que o imbróglio também
passa a preocupar os servidores estaduais.
A dúvida jurídica é: há o
direito constitucional de acumulação. Desde que a acumulação e a superação de
jornadas não sejam nas mesmas esferas estatais (acumulação só no estado, ou
acumulação só no município) pode-se interferir na esfera privada de decisão do
indivíduo sobre querer-se trabalhar ou deixar de trabalhar além da jornada
fixada pela Constituição? Na nossa avaliação, a superação do limite constitucional
de jornada de trabalho (44 horas semanais) somente seria ilícita se a
acumulação ocorresse em uma mesma esfera, mas não poderia haver limitação ao
livre arbítrio do servidor que resolvesse trabalhar 08 horas no Estado e outras
8 horas no Município (totalizando 16 horas diárias e acima do limite de 44
horas semanais).
No entanto, outros
argumentos são apresentados, tal como a necessidade de plena higidez física e
mental, que somente o descanso adequado proporciona.