ATRASO NA ENTREGA DA OBRA? CONSUMIDOR PODE ACIONAR A JUSTIÇA PARA REVER CONTRATO.
Se obra está atrasada, não incidem
juros sobre a dívida
Não
há de se argumentar caso fortuito ou força maior. Se a incorporadora atrasou a
obra, deve suspender imediatamente a continuidade da correção monetária
aplicada ao saldo devedor do imóvel, por meio do Índice Nacional de Custo de
Construção[1]. Com o boom
imobiliário, esse entendimento, há alguns anos impensável, vem sendo cada vez
mais atestado pela Justiça estadual paulista.
Só
no escritório Tapai Advogados, de acordo com levantamento da banca, em janeiro
de 2012 já foram quatro liminares favoráveis aos consumidores neste sentido. Em
2011 foram doze liminares, enquanto em 2010, nenhuma. O advogado Marcelo Tapai,
especialista em Direito Imobiliário, explica que uma mudança vem ocorrendo no
entendimento do Judiciário.
O
INCC é um dos três itens que compõem o Índice Geral de Preços, representando
uma fatia de 10%. É elaborado pela Fundação Getúlio Vargas e afere, mês a mês,
os custos dos insumos empregados em construções habitacionais. Ao analisar os
casos, os juízes aplicam o Código Civil, o Código de Defesa do Consumidor e
também a Lei de Incorporação Imobiliária.
"Muitas
vezes, o consumidor faz um empréstimo para pagar o saldo e a demora faz com que
ele também pague juros sobre ele. Quando a obra atrasa, o montante do
financiamento também aumenta", explica o advogado. O argumento empregado
pelas construtoras para justificar essa cobrança diretamente revertida para
suas contas é que a correção monetária apenas repõe a perda do poder aquisitivo
da moeda.
Mas
o advogado explica, por exemplo, que o INCC está acima da inflação. Em 2011,
esse índice foi de 7,45%, cobrado sobre o saldo devedor. "A construtora
tem tudo para estar dentro do prazo, já que se planejou para a obra. O acerto
do prazo é sempre unilateral e muitas vezes, em meio a tantos empreendimentos
parecidos, a promessa da data da entrega é um diferencial. Pagar o INCC no
atraso é premiar o inadimplemento", diz.
Com
escritório no Rio de Janeiro, o advogado Ronaldo Gotlib, especialista em
Financiamento Habitacional, conta que o fenômeno vem ocorrendo no país todo.
"É algo lógico", acredita. "Se a empresa se compromete a
entregar no prazo, o índice não pode ser cobrado quando há atraso."
"O
CDC é pertinente nestes casos", diz. "Da mesma forma que uma obra
adiantada não vai ter desconto para o consumidor, ele não pode arcar com os custos
do atraso", diz.
Passou
pelas mãos de Tapai o caso de um consumidor que comprou um imóvel no futuro
Condomínio Fotografia, da incorporadora e construtora Camargo Corrêa,
localizado na região sul da Capital de São Paulo. Pagou, no total, R$
423.984,64. O combinado não foi cumprido e, ao que tudo indica, o imóvel será
entregue em meados de 2012, com atraso de um ano.
Na
Justiça, o consumidor teve seu pedido atendido. O juiz determinou o congelamento
da aplicação sobre o saldo devedor a partir do prazo de entrega previsto no
contrato. Na prática, o homem vai deixar de gastar R$ 15 mil.
Em
outro caso, em apelação julgada na Comarca de Cravinhos (SP), o
juiz José Gavião de Almeida entendeu ser incabível a cobrança do INCC após a
conclusão da fase de construção da obra. A Cooperteto Cooperativa
Habitacional de Ribeirão Preto pedia que após a entrega das chaves o consumidor
deveria pagar as parcelas em dobro.
O
juiz entendeu que "o INCC é incabível após a fase de
construção e, no caso dos autos, não deve ser utilizado a partir da entrega das
chaves, sob pena de caracterizar onerosidade excessiva à recorrida".
O
Tapai Advogados também cuidou de um caso no qual o comprador tinha saldo
devedor para pagar à incorporadora PDG, em virtude de um imóvel comprado na
Granja Julieta, bairro da zona sul de São Paulo. Ao longo dos nove meses de
atraso, além do INCC, as incorporadoras Laguna e Munduruku, do grupo PDG,
quiseram cobrar do cliente juros de 1% ao mês mais correção por atraso de três
meses na entrega das documentações para financiamento.
A
sentença da 4ª Vara Cível do Fórum João Mendes Júnior determinou a restituição
e a diferença de correção monetária e juros cobrada de forma indiscriminada no
saldo devedor do comprador.
Fonte: Conjur, acessado em 11/02/2012.
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Comentários do Advogado Eduardo Figueredo de Oliveira
A
reportagem – apesar de marketing de
grandes escritórios – resume os problemas enfrentados por consumidores e as possibilidades
diante de tantos abusos.
Não
restam dúvidas de que as empresas do setor sabem dos percalços que encontrarão.
Sabem que não há trabalhadores em quantidade suficiente, sabem que os processos
em prefeituras demoram, sabem que dependendo da região pode haver a intervenção
do Ministério Público em questões ambientais (desmatamentos de grandes áreas em
região urbana ou solo contaminado em regiões antigamente industriais), sabem
também que em alguns casos pode haver escassez de material ou complicações decorrentes
do clima, como chuvas que impeçam a aplicação de concreto.
Mesmo
assim, as construtoras lançam empreendimentos que, sabem, não entregarão no prazo. E não entregarão mesmo que em quase todos os contratos esteja previsto um prazo adicional de 180 dias. As exceções
são os empreendimentos de alto custo. Neste caso, a história muda.
E
os danos morais? E os danos matérias, com a permanência em imóvel alugado?
Tudo
pode ser pleiteado em juízo.
[1] Índice de reajuste específico para o setor da
construção civil. É um medidor da inflação na construção civil. O IPCA e o INPC
são índices gerais que refletem a alta de consumo geral. Pode ocorrer uma alta
no setor de alimentos, mas também pode haver baixa no setor de serviços e isso
explica o equilíbrio / freio destes índices. Já o INCC leva em conta a demanda
na construção civil. Há muita procura de material, de força de trabalho na
construção civil? O índice aumenta. E aumenta mais do que em outros setores que
compõem o IPCA e o INPC.
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